A Tocha, a Faixa e a Caixa.

Essas 3 palavras juntas, não devem fazer muito sentido pra quase ninguém no Planeta. Mas pras pessoas da Família VIPER, faz.

Família VIPER: Yves Passarell, Rafael Masini, Felipe Machado, Andre Matos, Val Santos, Pit Passarell e Claudia de Souza Lima. Créditos: Arquivo VIPER

Desde que o Andre nos deixou, eu tinha vontade de escrever alguma coisa compartilhando algumas das histórias que vivi tão intensamente com ele no começo do VIPER.

Histórias que provavelmente só eu e mais uma meia-dúzia de pessoas, sabem. Ou lembram.

O lançamento da música “Sentido do Fim” no novo álbum solo, Primata, do Felipe [Machado] me deu vontade de contar algumas dessas histórias aqui.

Familia VIPER: Nando Machado, Sandra de Souza Lima e Marcia de Souza Lima. Créditos: Arquivo VIPER

Conheci o Andre no 1o. semestre de 1985. Ele ainda tinha 13 anos, uma criança. O primeiro Rock In Rio tinha acabado de acontecer e ele tinha visto o Iron Maiden, ao vivo! Eu tinha 15 anos ou acabado de fazer 16. Outra criança. Quase.

Lembro como ele sempe me pareceu mais velho do que era. Não fisicamente. Mas pelas suas ideias, sua compreensão do mundo, seu posicionamento em relação às coisas da vida, sua consiência.

Familia VIPER: Val Santos, Daniel Dystyler e Andre Matos. Créditos: Arquivo VIPER

Vou compartilhar aqui duas historinhas que pouquíssima gente sabe:

Nessa época, computadores pessoais eram caríssimos e raríssimos. Eu achava esse assunto interessante, mas como não tinha dinheiro para ter um, consegui emprestado de um amigo um CP200 (um computador pessoal “moderno” pra época, que tinha 16KB de memória – para colocar em perspectiva, pra armazenar 1 música em MP3, precisaríamos de uns 200 desses).

O Andre com seus 13 (talvez 14 anos) veio por vários dias seguidos na minha casa, para juntos programarmos o CP200. O que o nosso programa fazia? Ele pintava o logotipo do VIPER na tela, ao som de uma sonata de Bach. Nota, por nota, o Andre me falava, “agora é uma semicolcheia em Sol menor; agora uma semínima em Lá sustenido”. E eu ia programando o que ele falava. Nota por nota.

Depois de umas 2 semanas, orgulhosos, mostramos pro Felipe, Pit [Passarell], Yves [Passarell] e toda a nossa turma do Viper, o programa rodando, imprimindo na tela o logo do VIPER (aquele logo original, da capa do Soldiers of Sunrise) ao som da música de Johann Sebastian Bach.

Parece uma coisa estúpida (talvez seja mesmo). Mas na época, que era difícil até ver um computador ao vivo, aquela tela desenhando VIPER e tocando uma música que a gente “mandou” ele tocar, parecia mágica.

Familia VIPER: Felipe Machado, Daniel Dystyler e Yves Passarell. Créditos: Arquivo VIPER

A outra história que eu queria contar, aconteceu até antes do Andre ter vindo pela 1a. vez à minha casa:

O Yves começou a pilhar o Andre dizendo que ele tinha que conhecer a minha irmã, que ela era muito gata, que ela adorava heavy metal e que gostava de caras com cabelo comprido, etc.

Ele ficou vários dias, falando sobre isso pro Andre. Até que um dia combinamos deles virem na minha casa pra eu apresentar a minha irmã pro Andre. Eles chegaram, ficaram na sala e eu chamei a minha irmã.

Foi hilário ver a cara do Andre ao ser apresentado e ver que ela era uma criança de uns 7 anos de idade e que era só uma zoeira pra ver a reação dele.

Familia VIPER: Val Santos, Nando Machado, Daniel Dystyler e Pit Passarell. Créditos: Arquivo VIPER

Por fim, queria falar dessas 3 palavras que estão no título do texto: A Tocha, a Faixa e a Caixa.

Como disse no começo, essas 3 palavras juntas, não devem fazer sentido pra quase ninguém além de umas 10, talvez 15 pessoas da Família VIPER.

A 1a. geração de roadies do VIPER – autodenominada Roadies of Sunrise – era composta por Carlos Mauro, Marcos Cardoso, Rafael Masini, Val Santos e eu.

E essas 3 palavras compunham nosso pior pesadelo em dias de show: A Tocha, a Faixa e a Caixa.

Familia VIPER: Rafael Masini e Daniel Dystyler, Roadies of Sunrise. Créditos: Arquivo VIPER

A Tocha.

A tocha, acho que todo fã do VIPER sabe do que se trata: Ora em “The Whipper”, ora em “Soldiers of Sunrise”, o Andre entrava no palco com essa maldita tocha pegando fogo pra dar um efeito visual no show. As luzes eram abaixadas, e o Andre perâmbulava com a tocha por todo o palco, na bateria, no público, nos guitarristas, no Pit.

O nosso pesadelo é que aquela tocha era muito mambembe, zero profissional e nada segura: Era tipo um cabo de vassoura, com um pano amarrado numa das pontas e embebido em querosene. E sabíamos que era uma questão de tempo pra dar algo errado, como aconteceu no famoso show de lançamento do álbum Soldiers of Sunrise no Colégio Rio Branco, aonde quase uma tragédia maior aconteceu. As imagens com todo o ocorrido podem ser vistas aqui e desde esse dia, graças a Dio, o Andre decidiu aposentar a tocha.

Curiosamente, nesse show estreavamos um novo uniforme dos Roadies of Sunrise, uma camiseta vermelha que depois entrou pra história como sendo uniforme para roadies-bombeiros.

Familia VIPER: Carlos Mauro, Yves Passarell, Daniel Dystyler e Andre Matos. Estreia do novo uniforme dos Roadies of Sunrise no show do Rio Branco. Créditos: Arquivo VIPER

A Faixa.

A faixa era uma cenografia, que a gente tinha que pendurar atrás da bateria. A 1a. versão desse backdrop era pra ser uma espécie de dragão ou dinossauro com o planeta Terra atrás. O dragão parecia uma minhoca, e o pano devia pesar tipo 1 tonelada ou mais.

E os lugares que o VIPER tocava na época, geralmente não tinham estrutura para pendurar uma coisa gigante e pesada como aquela. Então todo show era uma operação de horas pra ver como os Roadies of Sunrise iam pendurar a tal da faixa. Tempos depois, deixamos pra trás a versão minhoca, e tivemos backdrops bem mais bonitos. E leves!

Por fim, a Caixa.

Familia VIPER: Carlos “The Box”, Daniel Dystyler, a Caixa, e Marquinhos “The Other Side of the Box”. Créditos: Arquivo VIPER

Yves Passarell conseguiu (não sei daonde) uma caixa de madeira maciça que ele decidiu que usaríamos para guardar e carregar alguns cabos e coisas da banda. Ele mandou adesivar o logo do VIPER na caixa e de fato ficou muito bonita.

Só que a caixa, pesava tipo 10 vezes mais do que o que ela continha e era um inferno carregar. Geralmente Carlos e Marquinhos eram os roadies designados para carregar esse suplício. Essa caixa ficou tão marcada que no encarte original do Soldiers, aonde estão listados os roadies, Carlos e Marquinhos aparecem como: Carlos “The Box” e Marquinhos “The Other Side of the Box”.

Legenda com os Roadies of Sunrise no encarte original do ‘Soldiers of Sunrise’.

Enfim… Tal qual aquele logo do VIPER aparecendo na pequena TV que eu tinha no meu quarto (sim, o CP200 não tinha monitor e você ligava numa TV) esses foram anos realmente mágicos.

Anos Incríveis.

Tenho muita saudade daqueles tempos. Tenho saudades da Claus. Tenho saudades do Andre. E das conversas que tinhamos.

E da aventura que era uma turma de crianças de 13 a 17 anos, tentando conquistar o mundo através do heavy metal numa época que no Brasil ninguém sabia o que era isso.

Muito linda a homenagem que o Felipe fez pro Andre em “Sentido do Fim” (ouça aqui) e me deu vontade de escrever essas linhas, relembrando essas histórias, enquanto ouço a música no repeat.

A música termina repetindo o refrão da primeira música que o VIPER escreveu na vida.

E que genialmente, Felipe fez a música não terminar.
Fica incompleta, inacabada.

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