Texto por: Gabriel Mendes

O Swans assume diversas formas. Desde sua fundação, em 1982, a banda se reinventa constantemente e adaptou sua sonoridade ao longo de décadas em um exercício de auto fidelidade as composições de Michael Gira, que seguem sofrendo alterações de temas, estilos e gêneros num incansável processo. 

É difícil apontar definições ao falar do grupo, que já contou com quase 30 músicos diferentes em todas as formações e explora gêneros como o post-rock, industrial, noise e pós punk. A fase mais recente da banda (após um hiato finalizado em 2010, com quatro discos lançados e alguns dos mais elogiados pela crítica) trouxe novas experimentações sonoras em relação ao início da banda.

Em Leaving Meaning, lançado em outubro, Gira decidiu romper com a formação que acompanhou o Swans entre 2010 e 2017, criando uma rotatividade de músicos para os próximos projetos. A ideia é identificar um perfil mais adequado de artistas (por seu caráter musical e pessoal) de acordo com os conceitos e sonoridades de cada composição.

“Em colaboração comigo, os músicos, através de suas personalidades, habilidades e gostos, contribuem muito para a organização do material. São todas as pessoas cujo trabalho eu admiro e a companhia eu pessoalmente aprecio”, comenta o compositor no release de anúncio do mais recente projeto da banda.

O Wikimetal conversou com o vocalista sobre o novo disco. Confira logo abaixo.

Wikimetal: Queria começar falando sobre processos criativos

Michael Gira: Claro, não sei exatamente como posso responder a isso, mas vamos lá (risos).

WM: Cada álbum propõe uma atmosfera diferente, acompanhada de uma série de imagens singulares. A temática sempre acompanha um estado de espírito do presente? Ou você cria uma espécie de persona para compor?

MG: É uma boa pergunta. Eu geralmente não enxergo músicas, e acho que estamos falando do ponto de vista lírico, como sendo sobre mim, de nenhuma forma. Claro que minhas memórias e pensamentos estão ali, mas não sinto que tenha a ver diretamente comigo. Tento criar uma situação, ou um lugar em que o ouvinte pode experienciar algo.

WM: E você junta pedaços ou planeja tudo de forma já completa? Pensando, por exemplo, em músicas de 30 minutos.

MG: É um processo de descoberta, claro que faço anotações enormes antes de ir a estúdio, e também algumas espécies de gráficos de para onde as coisas podem caminhar. Mas quando começo a trabalhar com outros seres humanos, que são criativos, talentosos e cheios de ideias, normalmente, alguns conceito pré programados caem e coisas novas surgem, e aí começo a moldar de formas que fazem sentido para mim.

WM: Sobre a escolha de repetições na estrutura das faixas, qual a origem dessa decisão?

MG: Não é uma escolha estética que preciso “cumprir”, para mim, mudar é meio como “trapacear” (ri). Estou interessado em como as coisas se desenvolvem ao longo do tempo em torno de uma estrutura rítmica central. Geralmente não me interesso por mudar acordes ou bases à todo momento, para obter muitas variações em uma música. Trabalho muito com dinâmicas e mudanças em orquestração, mas como você disse, tem algo central, que se abre em outras áreas.

WM: Existe algum plano de voltar a trabalhar com outros lançamentos além do Swans pela Young God Records? Você se sente livre tendo sua própria gravadora?

MG: Sim, definitivamente me sinto livre. Não tenho certeza se alguém estaria interessado em mim. Então tento criar minha própria situação, e me sinto muito agradecido por ter um público que se interessa na música. Sobre outros artistas no selo, senti em determinado momento que isso estava exigindo muito de mim como uma pessoa criativa, que faz sua própria arte e música. E financeiramente foi algo que não pude sustentar.

WM: Em que momento e como você trabalha em outras criações além do Swans?

MG: Há dez anos eu decidi que o Swans era eu e eu era o Swans. E tudo que eu faria musicalmente seria o Swans. Tive um outro grupo chamado Angels of Light, que não foi muito bem, eu achava que era musicalmente bom, mas decidi que o Swans era onde eu iria depositar meus esforços e vou manter dessa forma.

WM:O processo de mudança é uma característica muito presente na história da banda. Como essa metamorfose constante altera o processo criativo? 

MG: Eu acho necessário evoluir. Tem uma letra do Bob Dylan que diz “he not busy being born is busy dying”, então, eu considero a evolução algo muito importante. E eu nem sei o porquê. Só não tenho interesse em fazer a mesma coisa várias vezes. Acho que a música muda organicamente ao longo do tempo. Encontrei alguns elementos neste último projeto que serão sementes para um próximo, então vou guardar isso e tratar para criar algo novo

WM:O que Leaving Meaning significa para você?

MG: A música envolve declarações contraditórias que existem ao mesmo em que verdades são ditas. Estou interessado no que ocorre antes desses “significados” ou no espaço entre eles. Então é por isso que escolhi como o título do disco, é algo que me preocupou no passado recente.

WM:Fiquei muito interessado na escolha dos músicos que fizeram parte de Leaving Meaning, desde de todos que colaboraram em Angels of Light até Ben Frost e Anna von Hausswolff. Gostaria de saber como foi essa seleção e qual a sensação de trabalhar com artistas que você admira e não havia trabalhado antes.

MG: É uma benção. Me sinto muito agradecido. É ótimo trabalhar com pessoas tão talentosas a ponto de ajudar a tornar o que escrevi algo maior do que era antes, originalmente. Pessoas como as irmãs von Hausswolff acrescentaram muito ao processo musical e Ben Frost, como você mencionou, é um excelente compositor e tem uma sensibilidade sonora enorme, e também o grupo que participou de duas das músicas (The Necks) e formou esse combo, que é incrível. É ótimo trabalhar com pessoas diferentes.

WM:Como você acha que será a próxima turnê e o formato das apresentações, com esse novo grupo?

MG: Eu não sei! Tenho alguns sons na minha cabeça que busco com esse novo grupo, mas precisamos nos reunir e ver como faremos. Não será como no álbum, eu não gostaria disso, quero fazer algo diferente.

WM: A faixa “What Is This?” me chamou a atenção, especialmente no fim, por uma sensação estranha de esperança caótica, catártica. Você pode comentar um pouco sobre essa música?

MG: Não fiquei muito feliz com o resultado dessa faixa. Como você disse, soa um pouco positiva e esperançosa, talvez seja uma nova direção a seguir. Começou como uma melodia acompanhada de um violão e uma série de questionamentos sobre linguagem e consciência, e suponho que o coral final soa como “questões que não podem ser respondidas”.

WM:Como se manter esperançoso, ativo, e principalmente, em um constante processo de reinvenção?

MG: Bom, eu com certeza não sou um guia espiritual. Mas algo que constantemente me deparo, mesmo quando o mundo parece tão obscuro e confuso é que o simples fato de estar vivo é uma experiência incrivelmente estranha e mágica, e se você puder dar um passo para trás em relação a projeções pessoais sobre quem você é, o significado do mundo ou como você acha que as coisas deveriam ser, e experienciar a estranheza que é simplesmente existir, pode encontrar algo sedutor e recompensante.

Ouça Leaving Meaning logo abaixo.