Texto por Leonardo Orletti

No fim dos anos 90 surgia uma nova onda de bandas de metal sinfônico. Um estilo que unia o rock pesado ao uso abusivo de teclados e aos vocais influenciados pela música clássica. O produto dessa mistura eram músicas profundas e carregadas de melancolia, apesar do som quase sempre pesado. 

A principal inspiração desse novo estilo de música era o power metal, apresentado ao mundo pelos alemães do Helloween. Com algumas adaptações e influências era chegado o momento do internacionalmente famoso symphonic metal. Antes mesmo do início da década já havia bandas associadas a esse movimento, mas 1997 foi o ano em que ele tomou novas proporções.

A maioria das bandas vindas nessa nova onda era da Europa. Mas o movimento em si trouxe grupos dos quatro cantos do mundo. O Nightwish vinha da Finlândia. É bom lembrar que é provado que proporcionalmente os países nórdicos (Suécia, Noruega, Finlândia, etc) são as nações com o maior número de bandas de metal no mundo.

Um dos influenciados por essa cena musical extremamente propícia e motivado por sua paixão natural pela música era o multi-instrumentista, compositor, produtor e quem sabe algo mais Tuomas Holopainen. Ele se juntou ao baterista Jukka Nevalainen, ao guitarrista Emppu Vuorinen e à vocalista Tarja Turunen para formarem o Nightwish e lançarem o primeiro álbum do quarteto, Angels Fall First.

As linhas de baixo de todo o álbum foram gravadas pelo guitarrista da banda e na turnê de promoção do álbum o posto foi ocupado por Samppa Hirvonen. Mas chega de tantos nomes finlandeses! Ainda bem que a maioria do material do Nightwish é gravado em inglês.

A ótima “Elvenpath” dá início às atividades. Antes do início do instrumental da música, de forma bem poética a vocalista Tarja declama alguns versos apresentando ao ouvinte o tal caminho dos elfos. A escolha da faixa de abertura foi acertada. Nessa faixa tudo é muito intenso. O riff de Tuomas demonstra o poder dos teclados e a voz privilegiada de Tarja se destaca muito. A melodia e o peso se entendem bem e embalam a história que descreve o caminho onde a Bela encontrou a Fera.

A faixa seguinte é interessante. Ela se chama “Beauty And The Beast”. É um diálogo romântico e melancólico entre a Bela e a Fera (Tarja interpreta a Bela e Tuomas canta as falas da Fera), que já haviam sido citados na primeira música. Não só por isso as duas faixas são muito parecidas. “Beauty And The Beast” também tem riff de teclado e instrumental pesado, apesar de ser mais progressiva por conta de suas quebradas de ritmo.

O Nightwish nos dá a impressão de que seu álbum debut seja conceitual. Os temas das composições das duas primeiras faixas são muito parecidos. Além do conto francês da Bela e a Fera, são citados também os Elfos, gnomos e até os sete anões, todos personagens dos contos e da mitologia europeia e nórdica.

“The Carpenter” descontrói a ideia de temática única do álbum fazendo analogias à religião. A letra e o clipe deixam isso claro. Por falar nisso, essa é a única música a ter clipe e single lançados, ambos no ano seguinte ao lançamento do álbum completo. As partes interpretadas por Tuomas são musicalmente suaves e melancólicas e as partes de Tarja são mais pesadas. Essa foi a música de maior sucesso comercial na Finlândia.

“Astral Romance” é mais uma boa música. O instrumental é bem mais rock n’ roll que o normal e os vocais são mais voltados à música erudita. Os vocais de Tuomas servem de plano de fundo para o canto gregoriano de Tarja. O solo de guitarra é muito bonito. Acho até que os teclados que acompanham as seis cordas seriam dispensáveis. A música ficaria mais limpa. A letra é bem abstrata, mas também melancólica, abordando temas como angústia, cicatrizes e morte.

A quarta faixa é a última que tem vocais do tecladista e líder do Nightwish. Tuomas é também o compositor de todas as letras e produtor principal do álbum. Talvez dentre as tantas qualidades de Tuomas, a voz não esteja numa boa posição. O potencial de composição sim deve ser a primeira!

A faixa título volta a falar de religião, dessa vez questionando-a de forma não tão clara. A expressão “Angels Fall First” é naturalmente polêmica e questionadora. Pela primeira vez o Nightwish apresenta uma música totalmente acústica, mas de arranjo muito denso e melodia nem um pouco acessível. De fato, não é recomendável em apresentações ao vivo.

“Tutankhamen” é a sexta faixa. Essa sim teria retorno certo se fosse tocada ao vivo com mais frequência. Boa música que tem como temática a vida de Tutancâmon, um poderoso faraó do Egito antigo embalada por uma melodia marcante. Ainda sobre a letra, sinceramente, tenho dúvidas se interpretar as palavras de Tuomas seja mais fácil que identificar a árvore genealógica do faraó Tutancâmon. A título de informação, o primeiro parentesco dele foi identificado 88 anos depois do descobrimento de sua tumba.

“Nymphomaniac Fantasia” é outra canção suave e misteriosa, e dessa vez repleta de erotismo, como o título já adianta. E mesmo esse sendo um tema acessível, Tuomas é capaz de adaptar suas letras incompreensíveis. A flauta tão presente nessa faixa e na anterior é tocada por Esa Lehtinen.

“Know Why The Nightingale” é um verdadeiro alento. Depois de tanto sofrimento, Tuomas fala de sentimentos opostos à melancolia e à desesperança como alegria e liberdade. Musicalmente esse é o momento de Emppu Vuorinen! A guitarra pesada do Nightwish ocupa boa parte da música com riff e solos belíssimos, dando à faixa uma sonoridade mais voltada ao rock e metal clássico.

 A útima faixa chama-se “Lappi (Lapland)” e divide-se em quatro partes que ao todo formam um épico de quase dez minutos. A primeira é “Eramaajarvi”, a segunda é “Witchdrums”, um instrumental com apenas percussão e arranjos de Tuomas. A percussão de Jukka Nevalainen traz a tona influências tribais. A terceira parte é “This Moment Is Eternity”. Ela e a primeira parte são músicas bonitas e tristes embaladas pelos teclados de Tuomas. E a última parte chama-se “Etiainen”, outro instrumental.

Lappi é o nome de uma grande região localizada no norte da Finlândia. Não tem nada a ver com a origem da banda, já que a cidade de todos eles fica no sul do país. A letra da música realmente descreve um lugar como a terra da beleza, fria e cruel, etc. 

É interessante como o Nightwish lembra de sua terra em suas letras, às vezes de forma clara e outras vezes nem tanto. Falando sobre sua mitologia, suas histórias, tudo isso de forma um tanto emblemática, como não poderia deixar de ser, já que estamos falando de Tuomas Holopainen.

Esse é o maior destaque do primeiro registro da banda. As letras são muito sofisticadas, lembrando que o autor de todas elas tinha naquela época incríveis 20 anos de idade. Pela sua pouca idade e por esse ser seu primeiro trabalho profissional, Tuomas apresentava um potencial absurdo. Lembrando que além da escrita, ele era o principal responsável pela produção e grande parte dos instrumentais.

Não menos importante e um pouco mais obviamente, a voz da vocalista é um espetáculo à parte. Os vocais de Tarja Turunen dão grande dinâmica às músicas. A megalomania de Tuomas e o maravilhoso dom de cantar de Tarja aliados à guitarra, baixo e bateria bem tocados levariam o Nightwish a ser o maior expoente do metal sinfônico no mundo. E Angels Fall First era o primeiro passo nesse rumo.

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