Texto por Leonardo Orletti

No mundo em que vivemos hoje não é fácil analisar e/ou criticar um álbum como o debut do Pink Floyd. Cinco décadas depois de Syd Barrett, Roger Waters, Richard Wright e Nick Mason entrarem no lendário Abbey Road Studios em Londres, a impressão que tenho é de que, para os quatro, a psicodelia estava acima de tudo!

The Piper At The Gates Of Dawn exala psicodelia! A própria capa do álbum é a cara dos coloridos, exagerados e psicodélicos anos 70, que chegariam três anos depois. Imagino que em 1967 (ano do lançamento) o mundo já era assombrado pelas tendências dos anos dourados.

O ano de 1967 foi um período de uma explosão de criatividade ao redor do mundo. Em janeiro os americanos do The Doors investiram na poesia de Jim Morrison. Em maio, também nos EUA, Jimi Hendrix elevava a guitarra a um nível estratosférico. Nesse mesmo mês os ingleses The Beatles lançavam Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band que dispensa comentários.

No mesmo mês do lançamento do Sgt. Pepper, o Pink Floyd estava saindo do mesmo estúdio para alguns meses depois apresentar à Europa um novo nível de psicodelia e progressividade.

O então guitarrista e vocalista principal Syd Barrett era a alma criativa do grupo. Ele foi o responsável pela composição de dez das onze faixas do disco, os dois instrumentais em parceria com toda a banda e as outras foram creditadas somente a ele. E uma das canções foi escrita e cantada pelo baixista e vocalista Roger Waters.

“Astronomy Domine” é o título da faixa de abertura. A letra é misteriosa, sem sentido, totalmente psicodélica e praticamente falada, embalada por um instrumental igualmente estranho. Sem mais.

“Lucifer Sam” claramente tem mais “cara de música” e apresenta um andamento mais constante, sem perder a progressividade de seu som. O título da canção sugere algo polêmico, o que explicitamente não se confirma. Segundo Syd Barrett, Lucifer Sam é um gato siamês que sempre se sentava ao seu lado. Algo bem estranho, mas não polêmico.

“Matilda Mother” é também uma composição progressiva com algumas mudanças de ritmo ao longo da canção. A letra conta a história de uma mãe contando outra história para seu filho ou filha que se mostra interessado nesse tal conto mais progressivo que a própria música, de tão abstrato que ele parece ser. Na música ainda vale destacar um solo interessante do tecladista Richard Wright.

Em “Flaming” a psicodelia volta ao seu ponto mais alto, como em “Astronomy Domine”. O instrumental é mais uma vez sem muito sentido e a letra diz expressões como se sentar num unicórnio e dormir num dente-de-leão. Por aí é possível ter uma noção (ou não) das ideias de Syd Barrett.

A faixa cinco é um instrumental chamado “Pow R. Toc H.” É introduzido pelos samples e teclado de Richard Wright que depois divide seu trabalho com Roger Waters e com o baterista Nick Mason. Não é nem um pouco especial. A faixa só não pode ser considerada simples porque é repleta de sons bem diferentes, como cantos de pássaros. Sua composição é creditada aos quatro integrantes da banda.

Em “Take Up Thy Stethoscope And Walk” vejo influência dos primeiros anos dos Beatles. É a única composta por Roger Waters e cantada somente por ele. Não é um instrumental, mas boa parte da música reúne guitarra, baixo, bateria e teclados, cada um em seus auges. Aqui é o ponto onde vejo um quê de virtuose por parte dos quatro.

“Interstellar Overdrive” faz o ouvinte prestar mais atenção no que está acontecendo. É um instrumental de quase dez minutos de duração composto por toda a banda. A introdução sugere uma música mais direta, mas antes dos dois minutos essa teoria já cai por terra. A guitarra e o baixo do início me lembram The Who e trazendo um pouco o contexto para a música contemporânea, nada me tira da cabeça que a introdução de “Circle” do Slipknot foi inspirada num trecho dessa música.

Em “The Gnome” Syd Barrett volta à linha de frente da composição e dos vocais. Nela, o Pink Floyd conta a história de um gnomo chamado Grimble Crumble. Ele usava uma túnica escarlate e um capuz azul e verde e comia, bebia vinho, dormia, passava o tempo e nada mais de especial.

“Chapter 24” faz o ponteiro medidor de psicodelia quase que estourar novamente. Voltam aquelas práticas de letras e instrumental que só devem ser compreendidas pelo próprio Syd Barrett. Acredito muito na ideia de que eu não tenho muita maturidade para entender esse tipo de música. Coisas como o capítulo 24 são inexplicáveis.

“The Scarecrow” não passa muito longe dessa linha, apesar de contar uma história mais concreta, mas não tanto. Ela fala basicamente das emoções de um espantalho que não pensava e não se movia, exceto quando o vento soprava. É sério.

E finalmente, “Bike” segue outro caminho. Como disse um crítico inglês, ela se parece com uma canção de ninar, mas tem uma estranheza desconcertante. Tem a sua parte simples, se é que faz algum sentido associar essa palavra com algo do Pink Floyd e sua parte com sons estranhos e misteriosos.

Outra informação interessante é a variedade de instrumentos utilizadas na gravação de “Piper”. São quase vinte, além de alguns sons retirados de qualquer outro aparato, mas que duvido muito que seja algum instrumento. Só Richard Wright toca seis tipos diferentes de pianos e órgãos além de dar sua contribuição nos vocais.

Suponho que tenha ficado claro o bastante o tamanho da complexidade dessa obra. Essa realmente era a intenção. Mas deve-se pensar também que a audição desse material hoje é uma experiência totalmente diferente dessa mesma audição na época do lançamento do álbum, dados os contextos extremamente diferentes das duas épocas. Sendo assim, The Piper torna-se mais compreensível, ou melhor dizendo, menos incompreensível.

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