Texto de Rust Machado e fotos de Kristine Dias

No último final de semana de setembro, o estado de Santa Catarina fora agraciado com a presença de pesos-pesados do heavy metal germânico: Helloween, senhores e mestres do metal melódico, e o Scorpions, que tem cadeira cativa no panteão da velha guarda metaleira. Contentes com a possibilidade de verem um evento de grande porte sem a necessidade de cruzar fronteiras interestaduais, os fãs catarinenses encheram a casa e deram um espetáculo a parte na noite do dia 28, cantando, bebendo, dançando e tirando o máximo daquela experiência.

Longas filas esticavam-se na calçada da belíssima Arena Petry. Localizada em São José, cidade vizinha da capital Florianópolis, o prédio conta com instalações de altíssima qualidade e detalhes luxuosos, e recebeu aproximadamente 10 mil fãs em suas pistas, mezaninos e galerias de camarotes. Uma família inteira, vinda de Irineópolis (400km da capital) e completamente fardada com camisetas do Helloween tomou a frente da plataforma que aproximava os músicos da pista premium. Ao nosso lado, um casal vinha de Itajaí (96km da capital): amostras de um público vasto, espalhado e fiel. A longa e enfadonha espera pela primeira apresentação teve fim às 19h. Com a clássica “Initiation” (faixa que abre o clássico Keeper Of The Seven Keys pt. 1) soando nos PAs, já dava pra antecipar que o set do Helloween seria de clássicos.

O Helloween subiu no palco em franco estado de euforia, com Michael Kiske à frente fincando os dois pés na porta com “I’m Alive”. Quem está acompanhando a turnê das abóboras já sabia muito bem o que esperar: repertório enxuto, clássico atrás de clássico. A banda emendou “Dr. Stein”, trazendo Andi Deris para dividir os vocais com o lendário vocalista da era Keepers, e na soma das vozes, os fãs presenciaram um verdadeiro espetáculo vocal.

Andi assume as formalidades e comunica-se com o público, sempre no compromisso de mantê-lo entretido. Alimenta ainda o status mítico de Kiske ao deixar que ele conduzisse sozinho a execução vocal de “Eagle Fly Free”, na qual o trio de guitarras (Sascha Gerstner, Michael Weikath e Kai Hansen, que também retorna à banda após décadas de afastamento) enche os olhos e os ouvidos com todas as notas daquelas melodias tão familiares. Na sequência, o hard melódico de “Perfect Gentleman” e o speed quase thrash de “Ride the Sky” dão vez a Andi e Kai, respectivamente, para darem vida às interpretações que imprimem a marca da versatilidade no Helloween.

 A balada “A Tale That Wasn’t Right” iluminou a Arena Petry como um céu estrelado por flashes de celulares. A banda, dando aula de entrosamento, mandava os hinos a toque de caixa, como se estivesse jogando contra o tempo. Os músicos mantinham o contato visual com a plateia, jogavam palhetas, faziam poses. Em “Power”, o hino da era Deris, Weikath exibe uma lindíssima guitarra Jackson laranja-neon, contribuindo ainda mais para a experiência visual da banda, que conta ainda com cortes de cabelos moderninhos e figurinos fixos para a turnê. O público mostrou-se tão vidrado na performance do septeto de Hamburgo que até cogitava-se a dificuldade que o Scorpions teria de superar a magnitude daquela apresentação, cujo único ponto fraco foi mesmo a curta duração de uma hora.

Passando ainda por “Future World” todinha para Kiske e “How Many Tears” a três vozes, a banda encerrou com “I Want Out” com direito a coro de um público dividido em dois e chuva de bolas coloridas, finalizando o que pareceu ser uma versão pocket da monstruosa performance apresentada ao longo de 2017 (também no Brasil). Assim, o show apresentado mostra-se como vitrine perfeita para o lançamento do registro ao vivo lançado neste mês de outubro.

Mas apesar da excelente impressão deixada pelos alemães oitentistas, foi com a subida do Scorpions ao palco da Arena Petry que o público realmente se encontrou. De fato, este parecia ser o show mais aguardado da noite, agregando um público bastante versátil em idade e visual. Iluminados por um amplo telão e painéis de led que ajudaram a incrementar a sensação de “movimento” no palco durante todo o show, a banda inicia o longo espetáculo da Crazy World Tour com “Going Out With a Bang”, dando sequência com a melódica “Make It Real” e o primeiro grande clássico, “The Zoo”. O excelente tema instrumental “Coast to Coast” criou um ambiente puramente contemplativo, permitindo enfim que a musicalidade –  e não os ídolos – tomasse por completo a atenção dos presentes. No palco, o que se percebe é a presença extravagante do icônico baterista Mikkey Dee e a empolgação do baixista polonês Pawel Maciwoda.

Quanto aos clássicos guitarristas Rudolf Schenker e Matthias Jabs, se por um lado pouco tem a oferecer visualmente, por outro deixam seu virtuosismo caloroso e melodias emocionantes falarem por si. Para a satisfação dos presentes, Klaus Meine apresenta o seu potente agudo aos 71 anos sem esforço aparente, realizando um grande trabalho a frente do quinteto de Hanôver. A sós como o público, Mikey Dee teve a bateria içada no palco, e do alto mandou um solo destruidor, mostrando-se em plena forma. Enquanto os hits oitentistas como “Big City Nights” e “We Built This House” soavam grandiosos, mostrando o hard rock pesado e melódico da banda, foram as baladas “Winds of Change” e “Send me an Angel” (esta retomando o formato acústico que popularizou ainda mais a banda no memorável álbum ao vivo Acustica) que fizeram do espetáculo uma noite inesquecível para os catarinenses. Em tom devocional, o público entoou os hinos de ponta a ponta, com um destaque especial para a grande quantidade de rockeiras que ofertaram a casa um emocionante coro de feminino. No encore, a banda voltou ao palco para “Still Loving You”, onde mais uma vez a plateia teve a oportunidade de brilhar. Na sequência, a Arena Petry converteu-se em uma grande celebração rock n roll, com todos pulando e dançando para “Rock You Like a Hurricane”. A banda deixa o palco ovacionada, e os fãs, de alma lavada, começam a se organizar para deixar o recinto.

Por si só, quem esteve na noite presenciou duas grandes apresentações de clássicos do hard rock/heavy metal. Para além disso, a soma de forças exclusivamente teutônicas bem como a localização, em um estado que ainda não recebe a quantidade de eventos internacionais que merece, foram os ingredientes que fizeram desta uma noite para ser devidamente registrada no livro do rock de SC. O ponto fraco geral, deve-se pontuar, foi certamente a distância da pista “comum”, praticamente fora da vista até mesmo dos músicos que estavam no palco, enquanto a pista premium alongava-se desnecessariamente vazia em suas extremidades. Fora isso, os catarinenses mostraram que tem desejo de rock n’ roll em suas paragens, entregando-se com entusiasmo às atrações do evento e aguardando a próxima vez que serão contemplados com outros eventos de porte para prestigiarem em sua própria casa.

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