Formada em 2004 no Michigan e conhecida pelo estilo spoken word, e letras densas, intensas e viscerais, a banda de post hardcore La Dispute lançou nesta sexta-feira, 5, o disco No One Was Driving the Car, o primeiro em 6 anos.
Dividido em atos, o álbum conta com uma parte visual impactante e discorre entre temáticas do mundo moderno, como mudanças climáticas, crise existencial, perdas pessoais e mais.
Em conversa ao Wikimetal, o frontman Jordan Dreyer fala sobre como o filme de suspense/ação First Reformed (2017) inspirou o novo lançamento da banda, quais foram as músicas mais impactantes durante as gravações no estúdio, a influência da banda Slint na vida dos integrantes, e a possível vinda do La Dispute à América do Sul em um futuro próximo.
Leia a entrevista na íntegra logo abaixo:
WIKIMETAL: No One Was Driving the Car é o primeiro disco do La Dispute depois do lançamento de Panorama (2019), e nós sabemos que é inspirado no filme First Reformed, de 2017. Você pode contar pra gente um pouco mais dessa inspiração?
JORDAN DREYER: Claro, a gente decidiu desde o início que esse novo disco seria inspirado em um filme. Sempre nos baseamos em outros meios para construir projetos maiores como este. Em termos estruturais, eu acho que de certa forma isso nos empurra em uma direção que talvez não perseguiríamos se considerássemos apenas a música em si. Eu assisti First Reformed no cinema e me senti bem impactado e sigo sendo impactado pela história até hoje.
Eu acho que me conectar com histórias e outros trabalhos de arte é quase um rito de passagem, porque cada uma dessas coisas se conecta à mim em um certo momento da minha vida, e foi assim com esse filme, ele continuava voltando e voltando na minha cabeça. Então foi assim – essa combinação de que nós queríamos fazer um disco cinemático, mas também eu queria escrever sobre a forma como eu estava experimentando o mundo.
First Reformed é um filme incrível e reflete uma sensação que eu tenho por muito tempo. Eu acho que é uma ótima encapsulação dos momentos contemporâneos da nossa época atual. Foi um bom ponto de referência para falar sobre sentimentos coletivos como a mudança climática e a tragédia pessoal, e todo mundo navegando em um mundo volátil de sua própria forma, tentando estabelecer algum nível de controle ou compreensão do porquê as coisas são como elas são.
Músicas e inspiração para novo álbum
WM: Quando vocês perceberam que esse era um caminho que vocês queriam ir em relação à sonoridade da banda?
JD: Nós da banda nos engajamos com arte consistentemente. Nós estamos constantemente pensando sobre o que nos movimenta em nosso tempo individual, além de nós mesmos. Em relação ao nosso processo, eu sempre que chego a uma ideia na qual estou muito confiante, eu levo um tempo antes de passar para o restante da banda. Gosto de “incubar” esse sentimento e as ideias pra ter certeza de que é a direção certa para o projeto. Acho que em relação à esse disco, o tema escolhido ressonou com todo mundo da banda também. E nós nos encontramos em um lugar de urgência de criação do mesmo, tentando entender o mundo ao nosso redor.
WM: Tem alguma música no álbum que você sentiu que tinha um sentimento mais intenso por, que talvez tenha tido um processo mais intenso enquanto gravavam?
JD: Sim, tem um monte de músicas nesse disco que eu acho que me tocaram demais, talvez mais do que as de discos anteriores, até. Talvez porque passamos muito tempo sem lançar nada, fazia um tempo que não exercitava essa parte criativa na minha cabeça. E consequentemente, quando começamos a escrever as músicas, eu estava muito fixado no processo e em ter certeza de que tudo estava onde eu queria e que cada palavra fosse perfeita.
Quando estou imerso no processo da escrita, e acho que o resto da banda concorda, é fácil se desconectar um pouco do assunto que você está focado para fazer a melhor música e o melhor álbum que você pode, tecnicamente falando. Mas, quando você vai gravar, especialmente para mim, eu acho que é quando você começa a entender o quanto você se baseia em ser uma pessoa criativa. Estar em uma banda para processar as circunstâncias da sua vida e acho que eu entendi quando comecei a gravar as coisas que eu escrevi, o quão pouco eu faço fora da banda, e o quanto tempo eu passei longe de realmente pensar em minha própria vida emocional e as relações que eu tenho e onde eu estou no momento presente.
“I Dreamt of a Room with All My Friends I Could Not Get In”, foi uma música que eu acho que eu processei muito por cima. E eu fiquei bastante impactado emocionalmente quando chegou a hora de dizer essas coisas no microfone e tentar personificar aquele personagem e aquele sentimento.
“Environmental Catastrophe Film”, eu acho que eu processei bastante, em uma escala mais ampla, sobre o que significa estar vivo e minha própria visão do mundo nessa fase da minha vida. Uma música sobre perda pessoal, sabe? E mais uma vez me encontrei em um lugar de não ter processado muito sobre, até que chegou o momento de dizer essas coisas para o microfone.
WM: É incrível saber isso, sabendo da intensidade desse processo pra vocês, acho que as pessoas vão ouvir o disco de uma forma mais intensa. Talvez elas até se identifiquem com tudo o que você passou para conseguir gravar esse trabalho.
Possível vinda ao Brasil e relação com Slint
WM: Mudando de assunto – Eu vi no Instagram uma foto da banda recriando a capa de Spiderland, do Slint. Queria saber qual a relação de vocês com a banda, pode falar um pouco mais sobre isso?
JD: Claro, Slint é uma banda que se você existir nesse universo. Você inevitavelmente encontrará, por causa da influência exagerada que eles tiveram, e especificamente que Spiderland teve. É um disco como nenhum outro. O fato deles terem a idade que tinham e conseguirem escrever tudo que está ali e esse conteúdo ressoar até hoje…é muito especial. Eles foram uma grande parte do meu DNA por muito tempo.
Todos nós do La Dispute temos um gosto musical muito diferente, e eu acho que isso é parte do que faz nossa banda nossa banda. Nós temos muitos pontos de referência diferentes, mas Slint é realmente aquela banda que nos une, todos apreciam e se identificam muito com ela, e acho que essa influência é clara nas nossas músicas. É engraçado pois toda vez que estamos juntos na água, tiramos uma foto recriando essa capa (risos).
WM: Bom, não podemos encerrar essa conversa sem a pergunta de milhões – vocês tem planos de vir para o Brasil em breve? Nós estamos esperando por isso há alguns anos já!
JD: Em algum momento, sim! Nós negligenciamos a América do Sul por muito tempo, e a última vez que estivemos no país foi muito importante para nós e para nossa história. Foram muitas lembranças boas, conhecemos pessoas incríveis, enfim…estar em um lugar novo e experimentar uma nova cultura é maravilhoso. Você sabe, existem questões logísticas que nos impedem de fazer isso com certa frequência. Agora, nós temos um senso de urgência com esse lançamento, mas com certeza temos o Brasil em vista para uma visita no futuro. Nós vamos fazer isso acontecer. Devemos a América do Sul, devemos ao Brasil, devemos a nós mesmos.
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