Foto: Sebastian Cauvet

Muitos anos depois, aqui estou fazendo o que sempre sonhei na vida.”

 

UM SONHO DE CRIANÇA

Por Ricardo Batalha (*)

Descobri o Heavy Metal por acaso, na passagem de 1979 para 1980, ouvindo o disco “Volume 4” da banda inglesa Black Sabbath, a grande precursora do estilo. O álbum estava largado em algum canto numa estante do salão da casa de minha família, mas nunca tinha escutado-o. Até então, o que sabia sobre o Rock me fora passado por minha mãe, que gostava de Elvis Presley, Billy Halley, Little Richards, The Platters, Paul Anka e alguns outros astros do Rock And Roll dos anos 50.

No Heavy Metal costumeiramente alguém mais velho, da sua própria família ou do círculo de amizades, mostra um som para você e se aquele som de guitarras pesadas o pega “de jeito” pode estar certo que fará parte de sua vida para sempre. No meu caso, como minha mãe sempre relata, sempre fui vidrado em música e desde pequeno ficava dividido entre os esportes, os estudos e a minha sagrada vitrolinha portátil.

Apesar de não dançar nas festinhas de colégio, estava sempre antenado com o que estava rolando no momento, porque meu falecido pai havia sido advogado da gravadora Odeon (atual EMI) e habitualmente levava para casa caixas e caixas de LPs. Mesmo voltando todos os esforços nos estudos e esportes, era um ouvinte esporádico de rádio. Só que mantive a paixão pelos discos de vinil. Sendo assim, animei-me e comecei a ouvir tudo que tinha em casa. Em meio a muitas coletâneas, a maioria de Disco Music do final dos anos 70, estava o álbum “Volume 4”, que se tornou meu preferido. A partir daí, passei a ouvi-lo todos os dias.

Em mais uma coincidência do destino, o escritório do meu pai situava-se na rua José Bonifácio, no centro de São Paulo. Lá era exatamente o endereço da famosa loja de discos Woodstock. Com isto, comecei a visitar a loja e a comprar LPs, sempre com as indicações de um funcionário do escritório do meu pai, João Carlos de Oliveira, que entendia muito de Rock pesado e me indicava várias bandas. Fiquei hipnotizado e apaixonado pelas guitarras pesadas e aquele som característico do Metal. Isso começou a ser viciante, porque queria conhecer tudo e aí passei a freqüentar a Woodstock Discos semanalmente. Alguns dos primeiros LPs que comprei foram: Judas Priest “Unleashed In The East”, Judas Priest “Screaming For Vengeance”, UFO “Obsession”, Kiss “Dynasty”, Aerosmith “Rocks”, Scorpions “Virgin Killer” e Iron Maiden “Iron Maiden” importado, que tinha acabado de ser lançado.

Para aumentar meu conhecimento, comprava toda sorte de literatura ligada ao Rock que encontrava nas bancas ou livrarias. Adquiria enciclopédias, revistas, livros daqui ou publicados no exterior… Absolutamente tudo que havia com a palavra Rock estampada na capa eu ia atrás. Cheguei ao cúmulo de fazer meu pai me levar de madrugada em uma banca de jornal – a única até então em São Paulo que funcionava 24h – que ficava próxima ao Parque do Ibirapuera só para perguntar se uma revista de música que eu queria ler havia chegado. Até na escola onde estudava, Liceu Pasteur, vez ou outra eu passava horas extras com a professora me ajudando a ler alguns artigos sobre Heavy Metal em publicações francesas.

Como o colégio tinha ligação com a França eu ia com a revista Enfer nas mãos e pedia ajuda na tradução das matérias. Enquanto a professora se mostrava chocada com algumas artes das capas dos discos, com o visual das bandas, eu ficava fascinado com aquela publicação, que surgiu no mercado editorial em 1983 e sumiu tempos depois.

Também era meu costume redigir cartas para diversas publicações ou diretamente para as bandas, ainda mais depois que consegui uma foto autografada do vocalista Ronnie James Dio. Pena que nunca obtive resposta para a carta que escrevi para a Enfer na tentativa de assinar a revista. Isto anos depois foi uma grande lição para mim, pois aprendi que o tratamento e o respeito ao leitor de uma publicação tinha que ser impecável.

Passados alguns anos, lá estava eu acompanhando meu pai – que era um advogado conceituado na área do Direito Comercial – em mais uma visita a um cliente. Desta vez a reunião seria em uma gráfica que passava por dificuldades e estudava a possibilidade de entrar com pedido de Concordata Preventiva. Naquela reunião, o então dono da gráfica perguntou-me o que eu mais queria fazer na vida. Respondi que queria fazer uma revista de Rock e ele me deu uma espécie de boneco e mandou rabiscar meu projeto. A capa da revista imaginária seria o Black Sabbath.

Como sempre gostei muito de escrever, especialmente sobre música, fazia resenhas de discos em agendas ou nos cadernos escolares e passei a me ver trabalhando numa revista, em uma editora ou onde quer que fosse. Estudava outras coisas e tendia para o Direito, mas a música caminhava com uma intensidade muito maior em minha vida. O Basquetebol era outra grande paixão, mas como me contundia seguidamente não foi possível seguir no esporte profissionalmente como meu pai desejava.

Já no final dos anos 80, como não consegui espaço para trabalhar na revista Rock Brigade ou na mídia do Rock que havia até então, comecei a editar meu primeiro fanzine ao lado dos irmãos Caio e Conrado Tabuso, dois amigos do Basquetebol. Saíamos em busca das novidades e fazíamos de tudo para deixar o DeathCore Zine atrativo. Caio era um desenhista de mão cheia, Conrado fazia os contatos e eu cuidava da criação e da produção. A redação cabia a todos. Como nossos contatos eram amplos no underground, conseguíamos fazer entrevistas, coberturas de shows e resenhas de discos recém-lançados (alguns até em ‘advanced-tape’) e Demo-Tapes. Além disso, as vendas do fanzine nas lojas de discos eram significativas. Walcir Chalas, proprietário da Woodstock Discos – que já funcionava em novo endereço, em frente ao Metrô Anhangabaú – nos ajudava cedendo alguns lançamentos e vendia o DeathCore Zine, que se esgotava rapidamente por lá.

Muitos anos depois, aqui estou fazendo o que sempre sonhei na vida. A revista ROADIE CREW, especializada em Heavy Metal e Classic Rock, é uma realidade. As metas da principal publicação de música pesada do Brasil seguem as mesmas: nunca achar que está bom para não haver estagnação; dar um passo de cada vez; pensar em sempre se superar; criar coisas interessantes e fazer o fã de Metal ter bons momentos de leitura. Conseguimos!

 

(*) Ricardo Batalha é redator-chefe da revista Roadie Crew; diretor da Brasil Music Press/Assessoria de Imprensa; colaborador dos programas de TV Maloik, Stay Heavy e Rock Forever; da Rádio Shock Box, do Sleevers Rock Channel; do Programa Heavy Nation (Rádio UOL); e colunista do Jornal Momento Notícias.

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Categorias: Opinião