O anúncio do segundo álbum solo de Till Lindemann, em parceria com Peter Tagtgren, foi surpreendente em dois sentidos. O primeiro, é que viria alguns meses depois do novo disco do Rammstein, cujo intervalo com o anterior foi de dez anos. O segundo é que, diferente da estreia em Skills In Pills, o álbum não seria cantado em inglês, mas no alemão nativo de Lindemann.

Uma dose dupla do excêntrico vocalista, então, poderia parecer repetitivo. E, a princípio, essa é mesmo a sensação. Skills In Pills foi gravado em inglês para diferenciar o trabalho do Rammstein e transformou o álbum em uma sátira das perversões da figura pública do cantor, elevadas ao extremo pelo entendimento fácil da língua. Quem não é familiarizado com a língua germânica, deve imediatamente ligar F & M à banda que popularizou Lindemann.

“Steh Auf”, a abertura, poderia ser uma faixa saída do Rammstein, mas logo se percebe no que os trabalhos diferem: Peter Tagtgren. As composições meio robóticas, o senso sombrio e o piano grandiloquente do sueco se encaixam perfeitamente aqui e se mostram presentes em todo o disco.

O fato de ser uma dupla de compositores ajuda o disco a ir por caminhos inimagináveis no democrático e superpopuloso Rammstein. “Knebel”, por exemplo, é quase uma balada folk predominada pelo violão. Até que, na segunda metade, os gritos de Lindemann transformam totalmente a faixa em um metal industrial.

Já “Ach So Gern” muda de novo a direção do trabalho com uma espécie de tango com um baixo bastante groovado. É como se o alemão e o sueco dessem uma passadinha na Argentina para um de seus banquetes regados a vinho e sexo.

Cada uma das faixas de F & M se apresenta em um território novo para o duo, sem que as marcas registradas de ambos se percam. Tematicamente, o disco se inspira livremente no conto de “Hänsel & Gretel”, dos Irmãos Grimm, o “João e Maria” germânico. Os assuntos são os mais apropriados para estampar o rosto de Till Lindemann: medo, esperança, pobreza, abundância, canibalismo e morte.

Outro aspecto que ajuda o trabalho a se tornar coeso apesar de eclético são os videoclipes que a banda lançou. Aqui, sim, seguindo à risca os mandamentos do Rammstein, um clipe é mais bem produzido e mais maluco que o anterior. O de “Knebel”, inclusive, foi censurado na versão do YouTube, com a versão original indo parar no Reddit e trazendo sexo oral, menstruação e Lindemann comendo uma enguia viva. Pois é.

F & M, no final das contas, mostra-se o oposto do que parece em primeira vista. Apesar das letras em alemão, deve agradar uma audiência mais ampla, uma vez que transborda gêneros musicais e mantém uma unidade justamente na excentricidade criativa do duo Lindemann/Tagtgren. E mostra que a loucura de Lindemann, mesmo em dose dupla em 2019, nunca é demais.

Tags:
Categorias: Notícias Resenhas