Entrevista de Eric Campi. Texto de Daniel Dystyler.

Em passagem pelo Brasil para promover seu novo disco Names of North End Women, o Wikimetal teve a oportunidade de conversar com Lee Ranaldo, ex-guitarrista e vocalista do Sonic Youth.

Na conversa, super descontraída, Ranaldo falou sobre as inspirações do novo álbum e o fato dele ser o mais experimental até hoje. Falou também sobre as recentes parcerias que construiu, sobre ter feito a trilha sonora para um filme brasileiro, e muito mais!

Leia a entrevista na íntegra:

WIKIMETAL: Names of North End Women é um álbum muito experimental. Como você acha que a sua carreira te levou a este novo caminho?

LEE RANALDO: Uma das coisas legais sobre música é que é um processo colaborativo. Quando o Sonic Youth começou, a gente não sabia que ia ter essa conexão tão forte e tão duradoura entre a gente. Mas vez ou outra isso acontece na música, quando você encontra uma conexão tão forte. E quando terminou, comecei a fazer meus discos solos. No começo era só eu, dirigindo tudo, minhas músicas e tal. Mas depois encontrei o Raul Refree quando gravei um disco de acústico na Espanha, chamado Acoustic Dust, que eram versões acústicas de minhas músicas. E nesse momento, achei um novo parceiro. Não dá prever que isso vai acontecer nem como. Mas aconteceu.

Depois fizemos o Electric Trim. E nesse disco, achamos que fazia sentido colocar nossos 2 nomes no álbum. Somos um novo duo, tipo uma nova banda. E a ideia é seguir experimentando e testando coisas. Essa é a ideia.

WM: E essa colaboração com ele começou quando?

LR: Em 2013, lá na Espanha. Nos encontramos no estúdio e a gente se deu tão bem. E como aquele disco eram apenas versões acústicas de músicas minhas antigas, ele disse ‘vamos fazer novas músicas’ e aí fizemos o Electric Trim. Ele vinha de Barcelona pra New York, eu ia pra Barcelona, enfim, demos um jeito de fazer funcionar.

WM: E você criou letras junto com Jonathan Lethem, né? Como foi isso? 

LR: Bom o Jonathan é um amigo muito antigo. Não tão próximo, mas bem antigo. E quando eu estava trabalhando no Electric Trim, fiquei pensando que seria legal ter alguém pra colaborar comigo nas letras. No Sonic Youth, a música era feita por todos de forma colaborativa, mas as letras eram individuais, uma coisa solitária. Quando comecei a fazer meus discos solo, a responsabilidade de fazer tudo, música e letra era minha. E eu queria compartilhar isso. Quando encontrei o Raul, passamos a fazer as músicas juntos, mas achei que seria legal ter alguém pra colaborar nas letras e foi aí que Jonathan Lethem veio. É muito legal ter letras que não representam somente o meu ponto de vista, mas de outra pessoa também. Jonathan é perfeito pra isso. Ele é um “professor das palavras”. Trabalhamos muito bem juntos. É muito bom pra mim ter a visão dele, as letras dele, enfim, a “voz” dele nas músicas.

WM: É diferente trabalhar com as letras de outros nas suas músicas?

LR: E algo que me surpreendeu! Como eu faço as melodias e gravo o vocal, eu acabo sentindo que, mesmo as letras que foram escritas por ele, passam a ser minhas também. Eu preciso entender a visão dele e internalizar isso e acabo me sentindo dono.

WM: E como foi o processo de gravação? Vocês usaram muitos instrumentos, né?

LR: Gravamos com vários instrumentos diferentes. Nós tinhamos feito isso também no Electric Trim, mas usamos mais demos de guitarras. Dessa vez, tentamos muitas coisas. Batidas eletrônicas, samples, marimbas e claro, partes de guitarra. A guitarra faz parte do álbum claro, mas possivelmente é a menor participação de guitarra que já teve em algum disco meu. O que foi interessante pra mim, assim pude concentrar nos vocais e em outras coisas.

WM: E não foi difícil deixar a guitarra um pouco de lado?

LR: Não, não.. Na verdade foi fácil. O processo de ficar experimentando outras coisas foi muito divertido. Nem pensamos muito sobre o quanto de guitarra tinha no disco. Queríamos que fosse bem experimental. Não repetir coisas do passado. Os shows queremos que sejam bem experimentais também.

WM: O nome do disco Names of North End Women, também é bem curioso. Você pode falar um pouco sobre isso?

LR: Na verdade eu tive a ideia do nome do disco quando fomos visitar a cidade natal da minha esposa, Winnipeg no Canadá. Vamos sempre na época do inverno quando está muito frio, cheio de neve. Eu estava andando na parte norte da cidade e vi que as ruas levavam nomes de mulheres. Mas eles tinham apenas o 1o. nome das mulheres, não o nome completo. Era tipo Helen Road, Lidia Street, Harriet Place, esse tipo de coisa. Comecei a pensar, quem são essas mulheres, por que esses nomes? Elas fizeram algo famoso? Elas moram nessas ruas? Será que algumas delas foram celebradas e outras oprimidas? Comecei a pensar nisso e escrever uns poemas. E comecei a pensar como os nomes de diferentes pessoas vêm e vão pelas nossas vidas, algumas ficam por pouco tempo, outras ficam pro resto da nossa vida. E achei que seria uma boa ideia para usar no disco.

WM: Você acha que este álbum marca uma nova fase na sua carreira?

LR: De certa forma, sim. Trabalhar com o Raul foi um marco sem dúvida. Após 30 anos estando em 1 banda tão especial como o Sonic Youth, um banda no modelo mais tradicional, 2 guitarras, baixo e bateria, é muito refrescante estar fazendo essa parceria com o Raul. Eu não quero voltar pro modelo de 2 guitarras, baixo e bateria. Eu quero ser mais experimental ainda. Aprofundar a experimentação.

WM: E como serão os shows ao vivo?

LR: Ainda não sabemos bem como faremos shows ao vivo com todos esses instrumentos e elementos [risadas]. Ainda não sabemos. Acho que possivelmente os primeiros shows serão apenas nós 2. Queremos que tenha uma vibe como se fosse uma peça de teatro, sabe? Cenário com luzes, pessoas sentadas, etc. O disco tem umas narrações. Então pode ser bem como um teatro. Sei que queremos que seja bem experimental.

WM: E você fez uma trilha sonora para o filme brasileiro, Ainda Temos A Imensidão Da Noite, né? Como isso rolou?

LR: Sim, sim! Eu estava tocando em Brasília e após o show, a atriz do filme, Ayla Gresta, veio falar comigo e me colocou em contato com o diretor do filme, Gustavo Galvão. Começamos a nos falar por Skype entre New York e São Paulo. E isso me deu a oportunidade de voltar algumas vezes pro Brasil, em particular pra Brasilia que gosto muito por conta das coisas do Oscar Niemeyer. Passei 1 mês em Brasília, gravando, mixando, etc. Foi muito legal. E o filme estreou este mês, em Porto Alegre. Foi muito legal. Quem sabe vamos fazer isso de novo pro próximo filme dele.

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