O Orgulho e a Vergonha de “Ser Metal”

Por Daniel Dystyler

“Muita coisa aconteceu desde que Rob Halford disse com muito orgulho ‘Nós somos Metal'”.

Heavy Metal não era um termo popular quando as pessoas começaram a usá-lo no fim dos anos 60 e começo dos 70. Apesar de grandes bandas como Black Sabbath, Deep Purple e Led Zeppelin terem criado o som que foi identificado como Metal, eles não se viam como sendo Heavy Metal, ainda era um conceito externo. Eles se viam como bandas de Hard Rock, e acho que o que é importante é que quando o Judas Priest começou a ganhar popularidade no final dos anos 70 e começo dos 80, essa foi a primeira banda e Rob Halford foi o primeiro músico a se levantar e dizer “Nós somos Metal”. Isso deu uma guinada neste tipo de música, pois passou da coisa que as pessoas evitavam e até tinham vergonha, para algo que é uma identidade e um distintivo de honra. E se o Metal, como sempre discutimos, é um estilo de vida e uma cultura, então esse foi o momento em que tudo começou, quando Halford se levanta e diz “Nós somos Metal”.

A frase acima não é minha.

A frase acima é do famoso antropólogo e cineasta, Sam Dunn, autor de “Metal, a Headbangers’s Journey”, “Iron Maiden, Flight 666”, “Rush, Beyond The Lighted Stage”, “Global Metal” e a genial mini-série “Metal Evolution”.

Mas se a frase não é minha, ao menos a pergunta é:

Sam Dunn disse essa frase, em entrevista ao Wikimetal, quando eu citei o final do episódio 3 do “Metal Evolution” sobre essa passagem de Rob Halford e a importância das pessoas terem orgulho de “Ser Metal”.

E desde esse momento marcante e simbólico que Rob Halford assumiu com orgulho “Ser Metal”, todas as bandas passaram a ter, nas palavras de Sam Dunn, “uma identidade e um distintivo de honra”.

Certo?

Errado.

Infelizmente, a realidade mostra que não é bem assim…

Nestes mais de 6 anos desde que fundamos o Wikimetal, tivemos algumas passagens que foram tão surpreendentes quanto decepcionantes e que acho que vale a pena compartilhar aqui. Ao menos, duas delas.

A primeira foi com um dos maiores vocalistas da história, Ian Gillan.

O Nando o entrevistou pela primeira vez no 1o. ano do Wikimetal, em Novembro de 2011, e o lendário vocalista do Deep Purple foi de uma simpatia enorme. Ficamos verdadeiramente maravilhados com aquele episódio no. 50, um número simbólico (50 episódios!) com um dos maiores nomes da música que foi extremamente generoso e simpático com a gente.

Passados 3 anos, em Novembro de 2014, a honra de entrevistá-lo passou a ser minha e assim que iniciamos a entrevista, eu solicitei ao nosso convidado a mesma coisa que solicitamos a todos os nossos entrevistados nestes quase 300 especiais que fizemos: A gravação de um ID dizendo “Oi, aqui é o Ian Gillan do Deep Purple e você está ouvindo o Wikimetal”.

Nada de mais, certo? Isso é realmente comum e de praxe em praticamente qualquer entrevista e todos os artistas são muito solicitos e estão realmente acostumados a gravar esse tipo de vinheta. E por isso que foi tão surpreendente ouvir como resposta, do lendário Ian Gillan:

“Não. Não vou gravar porque não quero nosso nome vinculado a nada que seja Metal”

Pra mim, foi um verdadeiro choque. Ouvir do vocalista do Deep Purple, uma das bandas fundadoras do Heavy Metal, isso aí.

Ainda argumentei que “Wikimetal” é o nome do nosso programa, mas ainda assim, ele não quis gravar.

A parte boa desta história:
Comecei a entrevista fazendo a 1a. pergunta, e antes dele responder, ele voltou atrás e decidiu gravar o ID. Menos mal.

A segunda história que gostaria de relatar:

Show do System Of A Down na Arena Anhembi em São Paulo em Setembro de 2015, com abertura do Deftones:

Usamos bastante as plataformas do Wikimetal para divulgar e no dia do evento, eu fiquei com a incumbência de fotografar o show para gerar a nossa tradicional galeria de imagens e publicar no nosso Portal.

Meu credenciamento já havia sido aprovado, quando na véspera do show, o pessoal da produção me ligou e pedindo mil desculpas, constrangidos, me disseram:

“Daniel, vamos ter que revogar seu credenciamento como fotógrafo. Você ainda pode ir como repórter, mas não pra tirar fotos”


“Ah, tudo bem, sem problemas!”
respondi, sabendo que isso é relativamente comum. Muitas bandas não permitem ou limitam totalmente o número de fotógrafos deixando apenas um ou outro, algumas vezes só 1 como fotógrafo oficial (como aconteceu nos casos dos shows do Queen, Guns N’ Roses, entre outros). Perguntei:

“Eles não vão deixar ninguém fotografar?”

“Vão……. Eles só não querem deixar portais de Heavy Metal”……

Ah… Ok… Entendi…. Obrigado Serj e obrigado Daron… É bom saber.

Como dá pra ver, muita coisa aconteceu desde que Rob Halford olhou pra aquela câmera no final dos anos 70 e pela 1a. vez com muito orgulho disse “Nós somos Metal”. A maioria seguiu esse exemplo, de ter orgulho do que somos, de ter uma identidade, um distintivo de honra.

Mas alguns não.
Alguns têm problema com o termo. Metal. Heavy Metal.

Recentemente, li uma entrevista com o vocalista do Korn, Jonathan Davis que disse:

“Eu sempre tive um problema com o termo ‘Metal’. Nós nunca fomos isso”.

A explicação dele é até coerente e faz sentido:

“Eu realmente aprecio e amo a comunidade Metal. Mas sobre ser uma banda de Metal, para mim uma banda de Metal é Judas Priest ou Iron Maiden. Isso é uma banda de Metal. Não acho que Korn faz isso. Eu sei que o que fazemos é diferente mas eu amo a cena e tem pessoas muito apaixonadas nela”

Sim, eu entendo o que ele quer dizer.

Ele está se atendo à tecnicidade do termo “Heavy Metal” como estilo musical. Nesse sentido, o Korn não é realmente um Judas ou um Maiden. Assim como o Metallica, o AC/DC, o Slayer, o Scorpions e muitos outros, também não são.

Mas pra terminar este texto pegando emprestado novamente a genialidade da frase inicial de Sam Dunn, quando ele diz que “o Metal é um estilo de vida e uma cultura”, não é apenas um tipo de música, então sim todos somos Metal, e é muito decepcionante vermos bandas fundamentais para o movimento, como um Purple ou um System, tentando se esquivar disso.

Aqui no Wikimetal, nós somos Metal. Com muito orgulho.

Obrigado, Rob Halford.

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