Cliff Burton, o talentoso baixista do Metallica no começo da carreira, morreu em um dos acidentes mais trágicos da história do metal. Na época do triste acontecimento, a banda estava em turnê de divulgação do álbum clássico Master of Puppets, lançado alguns meses antes, quando o ônibus que transportava todos os integrantes e equipe do Metallica sofreu o acidente. 

Ainda que tenha gravado apenas três álbuns com o Metallica, o jovem baixista de apenas 24 anos de idade deixou um legado duradouro na banda e, por consequência, na própria história do heavy metal, sendo uma referência para todos que ocuparam esse posto na banda desde então e uma memória viva na mente dos colegas e fãs.

Cliff Burton

Morte de Cliff Burton: o que aconteceu? 

Em 27 de setembro de 1986, os rumos do Metallica mudaram para sempre. Na noite anterior, a banda realizou um ótimo show em Estocolmo, na Suécia, na qual foram tiradas as últimas fotos de Cliff Burton em vida

Depois da apresentação, a banda seguiria viagem de ônibus para o destino seguinte: Copenhagen, na Dinamarca, mas não sem antes um jogo de cartas entre Burton e o guitarrista Kirk Hammett. Como lembra a Ultimate Classic Rock, o ganhador da partida poderia escolher onde dormir no ônibus de turnê naquela noite. Cliff Burton saiu vitorioso e reclamou o beliche anteriormente ocupado pelo colega. 

“Naquela turnê europeia, tínhamos um ônibus muito ruim. [No jogo de cartas], a primeira carta que Cliff pegou foi o Ás de Espadas. Ele me olhou e disse: ‘Quero seu lugar!’ e eu disse ‘Ok, pegue o meu beliche. Vou dormir lá na frente, provavelmente é melhor mesmo’”, contou Hammett sobre aquela noite em entrevista ao programa Behind The Music, do canal VH1

Bem cedo no dia seguinte, por volta das 7h da manhã do fatídico 27 de setembro, enquanto os músicos ainda dormiam depois de uma noite de sucesso e bebidas, o ônibus derrapou na estrada e tombou de lado na estrada. Assustados, os integrantes do Metallica saíram do veículo e descobriram o corpo de Cliff Burton embaixo do veículo. Durante a derrapagem, o baixista foi arremessado pela janela e o ônibus caiu em cima do músico. Segundo relatos, foram feitas tentativas de resgatar Burton ao levantar o ônibus com um guindaste, mas o equipamento escorregou e o veículo caiu em cima do corpo do jovem músico uma segunda vez.

De acordo com o motorista do veículo, a derrapagem do ônibus foi provocada pela suposta presença de gelo negro na estrada, um fenômeno no qual uma camada de gelo vítreo se forma sobre uma superfície. Geralmente, esse fenômeno é praticamente invisível aos motoristas. 

Ainda assustado e bêbado, James Hetfield alegou que caminhou vários quilômetros na estrada logo após o acidente e não encontrou vestígios de gelo, o que resultou em uma reação violenta contra o motorista. A suspeita de alguns integrantes da banda era que o homem estava drogado ou que teria dormido no volante, algo que o condutor negou. “Eu queria acabar com ele ali mesmo”, contou o vocalista ao VH1.

Scott Ian e o emocionante relato sobre a morte de Cliff

A turnê do Metallica interrompida pelo acidente e morte de Cliff Burton era em conjunto com o Anthrax, de quem eram mais do que meros colegas de profissão, mas bons amigos. Com isso, a outra banda também sofreu o impacto dessa perda em primeira mão. 

Um dos relatos mais detalhados e emocionantes da morte de Cliff Burton está livro autobiográfico de Scott Ian, chamado I’m the Man: The Story of That Guy From Anthrax, no qual o guitarrista do Anthrax relembra a sensação perturbadora de receber a notícia.

O Anthrax já estava fazendo check-in no hotel da Dinamarca quando viram o empresário deles conversando com alguém. Eles se aproximaram para cumprimentá-lo e perceberam que algo estava errado: “Vi a expressão de choque completo no seu rosto. Ele estava pálido e parecia assustado. Algo não estava certo. ‘O promotor do show de hoje me falou que houve um acidente’, ele me disse. ‘O ônibus do Metallica capotou no caminho pra cá.’ Ele parou de falar por um momento, e voltou a falar como que forçando as palavras a saírem da boca. Como se tossisse as palavras. ‘O Cliff morreu no acidente. Todos os outros estão bem. O Lars sofreu alguns machucados leves e foi levado ao hospital’”, narra Scott no livro.

A princípio, o guitarrista não conseguiu processar aquela informação e achou que era alguma brincadeira boba dos colegas do Metallica.  “Meu cérebro começou a girar. Eu comecei a re-ouvir a frase na minha cabeça repetidamente. ‘Cliff morreu no acidente’. Depois do que pareceu serem cinco minutos, que provavelmente deve ter sido dez segundos, eu balancei a cabeça e falei ‘Sério? Sério? E você acredita nisso?!?’. Eu estava em negação. ‘Não é possível. Eu tenho certeza que eles ficaram doidos demais para pegar o ônibus e inventaram essa história maluca. Vamos rir disso depois’. Qualquer coisa pareceria mais plausível do que imaginar que o ônibus capotou e que Cliff estava realmente morto. Eu nunca tinha ouvido falar de nada desse tipo, como um ônibus capotar e menos ainda causando a morte de um colega. Parecia surreal. Quando você está nessa bolha de turnês e as coisas estão indo muito bem, você se sente invencível. Algo assim acontecendo parecia completamente improvável. Eu perguntei ao promotor ‘Você tem certeza?’. ‘Sim, eu tenho certeza’, ele disse”. 

Scott Ian e Cliff Burton
Scott Ian e Cliff Burton. Créditos: Reprodução/Ultimate Classic Rock

O legado de Cliff Burton no Metallica

Na época do acidente, Burton tinha apenas 24 anos. Ainda assim, o músico já havia gravado três álbuns icônicos com o Metallica: Kill ‘Em All (1983), Ride The Lightning (1984) e Master Of Puppets (1986), além de ser o responsável por uma das faixas instrumentais mais bonitas do metal: “Orion”.

A importância de Cliff Burton no Metallica é inegável. Comentado frequentemente por James Hetfield, Burton foi quem ensinou harmonias ao frontman, pois o baixista tinha um estudo de música clássica que faltava aos demais colegas. “Nós nunca teríamos composto harmonias de guitarra, músicas instrumentais, com melodias tão profundas, ou orquestrais, se não fosse por Cliff. Nós nunca estaríamos aqui se não fosse por ele”, comentou em entrevista a um jornal sueco em 2006.

Em 2012, durante entrevista ao Wikimetal, Lars Ulrich também comentou a influência do ex-baixista na banda. “Claro que Cliff era uma grande parte do som do Metallica e grande parte do molde da experiência do Metallica. Não apenas para os fãs mas para as pessoas do Metallica, ele trouxe muito para a banda. Ele foi o primeiro cara, eu acho, no Metallica a falar de Lou Reed, Velvet Underground, Lynyrd Skynyrd, ZZ Top, Peter Gabriel, Misfits. Ele trouxe muita coisa diferente. Mas eu não consigo te falar se o Metallica soaria diferente hoje, eu não faço ideia. Cliff estava sempre interessado em experiências, em arriscar, ele não era de ficar sempre na zona de conforto. Talvez a banda tivesse sido mais experimental e louca, não sei”, disse. 

Os baixistas do Metallica depois de Cliff Burton

Depois da morte de Cliff Burton, o Metallica saiu na busca por um novo baixista. A entrada de Jason Newsted, baixista do Flotsam and Jetsam, aconteceu três semanas após o funeral de Burton. Quando foi escolhido sob a enorme responsabilidade de substituir o falecido músico, Newsted teve a aprovação dos próprios pais de Burton depois de uma audição final. 

“Eu estava apenas me recompondo por um segundo, abaixando meu baixo, desligando o amplificador de Cliff – estava tocando a porra do amplificador de Cliff! – e Jan [Burton, a mãe de Cliff] entra sozinha na sala e me segura, chamando minha atenção. Ela disse, ‘Ótimo trabalho, filho’. Ela me abraçou por um bom bom tempo e disse: ‘Você é o certo, você deve ser você. Por favor, fique seguro, nós amamos você’, e me deu um beijo. Isso foi há 35 anos, e eu nunca, jamais esquecerei”, contou Newsted à Metal Hammer em 2021.

Com a polêmica saída de Newsted da banda, em 2001, o Metallica recrutou Robert Trujillo, que permanece na banda até hoje. No período de audições para entrar na banda, Robert estava morando na casa de Mike Bordin, do Faith No More, amigo pessoal de Cliff, que tinha uma foto grande do falecido baixista na sala de visitas. 

Diante daquela imagem, o músico resolveu fazer uma promessa ao baixista original do Metallica: “Conversei com a foto. Eu disse, ‘Cliff, eu não vou te decepcionar, eu te prometo. Vou fazer meu melhor’. De uma maneira estranha, me sinto conectado com Cliff, sinto que o conheço”, revelou Trujillo em entrevista para o livro To Live Is To Die: The Life and Death of Metallica’s Cliff Burton, de acordo com trecho publicado pela Bass Player

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